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domingo, 17 de agosto de 2014

"Os Embalos dos Reencontros de Escola" ou "O Eterno Suspiro da Adolescência Perdida"





Ah, os reencontros de alunos dos tempos de escola!!

Homens e mulheres, adultos todos, se reencontram para trocar experiências de vida e lembranças da época em que éramos crianças e adolescentes. Sempre achei esse conceito um pouco esquisito, meio forçado mesmo. Veja, a maioria das pessoas dessa época eu não reconheceria se se colocassem a minha frente, ainda assim, todos riem e até deturpam acontecimentos pretéritos sob pretextos diversos. Confesso que me achava estranho.

Quer dizer, eu percebia que eram encontros meio forçados, em que as pessoas tentavam resgatar algo do passado, algo já há muito perdido, e era estranho ver balzaquianas e barbados empolgados, com suas barrigas proeminentes e barbas mal-feitas, discutindo quem pega(va) quem, o quanto isso aconteceu, ou aquilo… Alguns até, pateticamente, tentando reatar relações românticas que foram fruto de um momento puramente adolescente…

Era uma adolescência caquética retornando de maneira vexatória… Eram espectros de tempos que deveriam ter servido apenas para construir o nosso caminho atual, e não o ponto mais alto da vida de, hoje, homens e mulheres… 

Eu confesso que quando recebo esses convites eu até simulo empolgação, pois de fato tenho um pouco de pena de quem os organiza, mas evito sempre que possível ir.




Até que tive coragem de conversar com algumas pessoas de meu círculo atual, pessoas com quem realmente tenho alguma relação, seja profissional ou mesmo de cunho pessoal… São advogados e advogadas dos tempos de faculdade,  ou amigos e amigas atuais, cuja amizade se formou já longe da neblina da imaturidade adolescente, onde interesses comuns pautaram o convívio. Pois bem, tive coragem e disse o quanto me sentia constrangido com esses encontros. Não estava só.

Uma colega minha disse que tinha a impressão de estar num episódio do seriado Além da Imaginação, em que as pessoas velhas estavam presas em corpos de adolescentes, com mil risinhos e grupinhos de adolescentes enrugados a dar pulinhos de alegria e trocar segredos… A maioria faz parte da hoje famosa classe média paulistana, muitos sem qualificação profissional, poucos com nível superior. As mulheres em geral donas de casa, os homens evitavam falar de seus empregos atuais. E, não, não estou falando de encontro de escolas públicas. Essa colega estudou numa excelente escola particular, assim como eu. 

Os garotos que praticavam bullying, em sua maioria, se tornaram fracassados crônicos, cheios de preconceitos e sem nenhuma perspectiva. Suas maiores glórias, suas maiores conquistas na vida parecem ter sido ligadas a tomar o lanche dos garotos mais fracos no colégio ou ir a jogos de futebol em estádios e cantar o hino do clube de coração no meio da torcida organizada.

Outra colega, essa mais jovem, disse que ficou chocada ao ver um grupo de homens, antigos colegas, já em seus trinta e poucos anos, disputando quem tinha o 'pum' mais fedido…

Lembro-me do embrião desses adultos na adolescência. Não tenho tantas boas lembranças do colégio (tenho boas também, mas acho que por algum mecanismo cerebral, tenho muito mais lembranças de momentos ruins), pois como disse eram grupos de meninos e meninas preconceituosos(as) e cruéis.

Certa vez, um garoto nordestino entrou na nossa classe. Era humilhado diariamente, chamado de "baiano", apanhava que nem o cão. Costumava ir de chinelo bem simples nas aulas, contra os tênis Rainha e outros dos nossos colegas (e meu). Não é preciso dizer que tiravam o chinelo dele e batiam no menino. Ele não parecia mesmo ter posses, talvez tivesse uma bolsa de estudo, visto que o colégio era mesmo muito caro, ou seus pais conseguiam pagar o colégio às expensas de outros contas (como de calçados). Não o vi mais no ano seguinte. Mas revi todos aqueles que praticavam bullying contra o 'baianinho', seja nas redes sociais ou nos encontros randomicos nas ruas. Hoje, em sua maioria,  tem um ódio patológico do PT, proporcional ao nível de fracasso profissional, social, romântico e acadêmico em sua vidas. Pensando bem não me recordo de um desses bullies (hoje adultos) que tenha uma vida estabilizada em qualquer ângulo de existência. 

Odeiam profundamente o último presidente nordestino que o Brasil teve e acham que ele é o culpado por seus fracassos, mesmo de antes dele ter chegado ao poder. Provavelmente imaginam que ele quis se vingar deles. Na verdade, parece-me que a ascensão de um nordestino, em qualquer campo, é o que mais lhes fere. Um desses adultos-garotos confessou-me nas redes sociais (em particular, é claro) que odeia nordestinos. Profundamente.

Então, essas pessoas se juntam, a outras de boa índole, com boas intenções, para tentar reviver as glórias do passado, um tempo em que eram reis e rainhas, em que a vida não lhes cobrava, duramente, maturidade e consciência. São reis e rainhas que não conseguiram deixar de ser adolescentes, em que pesem os fios de cabelos brancos. Foi uma época boa para eles aquela. Vivem nela até hoje… Por isso a maioria dos que "seguiram adiante" vai em uma ou outra reunião dessas, ficam chocados(as) e nunca mais retornam. Já aqueles que se reconhecem como pares adolescentes, sonham com os próximos encontros. Achava mesmo que era uma coisa minha, uma birra em relação a pessoas de um colégio conservador e católico, com pais extremamente católicos e hipócritas e filhos menos católicos e menos hipócritas, mas percebi que ao contrário do que parece, estou com a maioria. A idiotia é minoria sempre, e é algo que tendemos a esquecer nesses tempos sombrios em que a turba grita, fala alto, ganha as ruas, ganha nos Tribunais, mas perde nas urnas.


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