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terça-feira, 1 de outubro de 2013

Mensalão e embargos infringentes: o direito ao melhor direito - Luiz Flávio Gomes

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O caso mensalão está na fase recursal. Todos os réus condenados apresentaram embargos de declaração. É possível que alguns consigam algum tipo de benefício com esses embargos (redução de pena, por exemplo). Por quê? Porque os advogados alegam que houve aplicação de lei nova mais desfavorável (e isso é proibido no Direito Penal).
Mas a polêmica maior reside, evidentemente, nos embargos infringentes (previstos no art. 333 do Regimento Interno do STF), porque eles viabilizam a rediscussão da causa, consoante os limites dos votos vencidos (reanálise fática, probatória e jurídica). E serão julgados com a presença de novos ministros (um já assumiu e outro está na iminência de ser escolhido).
De acordo com a minha opinião não há dúvida que tais embargos (infringentes) são cabíveis naquelas situações (são catorze, no total) em que os réus foram condenados, mas contaram com 4 votos favoráveis (Delúbio, José Dirceu, João Paulo etc. estão nessa situação).
Dois são os fundamentos (consoante meu ponto de vista):
(a) com os embargos infringentes cumpre-se o duplo grau de jurisdição garantido tanto pela Convenção Americana dos Direitos Humanos (art. 8º, 2, “h”) bem como pela jurisprudência da Corte Interamericana (Caso Barreto Leiva);
(b) existe séria controvérsia sobre se tais embargos foram ou não revogados pela lei 8.038/90. Sempre que não exista consenso sobre a revogação ou não de um direito, cabe interpretar o ordenamento jurídico de forma mais favorável ao réu, que tem, nessa circunstância, direito ao melhor direito.
A esses dois fundamentos ainda cabe agregar um terceiro: vedação de retrocesso. Se de 1988 (data da CF) até 1990 (data da lei 8.038) existiu, sem questionamento, o recurso dos embargos infringentes (art. 333 do RISTF), cabe concluir que a nova lei, ainda que fosse explícita sobre essa revogação (o que não aconteceu), não poderia ter valor, porque implicaria retrocesso nos direitos fundamentais do condenado.
Pelos três fundamentos expostos, minha opinião é no sentido de que o ministro Joaquim Barbosa (que já rejeitou os embargos infringentes de Delúbio), mais uma vez, não está na companhia do melhor direito. O tema vai passar pelo plenário, onde, certamente, Joaquim Barbosa pode sair derrotado, devendo preponderar o pensamento do ministro Celso de Mello, que já se manifestou no sentido do cabimento dos embargos infringentes, invocando parte dos argumentos acima recordados.
Joaquim Barbosa deve ser derrotado, mais uma vez, porque não é por meio da soberba e do autoritarismo que se constrói o direito (ou mesmo a nossa própria vida). Quem busca guerra o tempo todo, não pode colher as flores brancas da paz. Em muitos momentos o destempero emocional do ministro Joaquim Barbosa evidencia que nós, seres humanos, nem sequer chegamos ainda ao grande meio-dia de Nietzsche, que explica que a evolução da humanidade está no meio do caminho entre o amanhecer e o anoitecer. Ou seja: o ser humano está entre o animal primata e o “além-do-homem” (o supra-humano), mas, em determinados momentos, nos apresenta a sensação de que está mais para o amanhecer que para o anoitecer.
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* Luiz Flávio Gomes é jurista e professor fundador da Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil e coeditor do atualidadesdodireito.com.br. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001).

PNAD 2012 e a imprensa

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Foi divulgado em 27 de setembro, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o resultado da última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) com dados referentes a 2012. Essa pesquisa é realizada, como o próprio nome já diz, por amostragem domiciliar. Ao contrário do Censo que cataloga todos os habitantes do Brasil. Na pesquisa se busca identificar indicadores dos mais variados tipos: escolaridade, renda, acesso a bens de consumo e a serviços básicos. Ela é realizada todos os anos.

Nos últimos números divulgados, percebem-se claramente como os indicadores sociais e dados de consumo melhoraram no país. Em todas as regiões brasileiras o rendimento médio mensal dos trabalhadores com mais de 15 anos cresceu 5,8%. A taxa de desocupação variou para baixo em relação a 2011, passou de 6,7% para 6,1% e o número de trabalhadores com carteira assinada cresceu 3,2% em um ano.

Há infelizmente, um aumento, mesmo que pequeno, na desigualdade de renda entre homens e mulheres. E há uma variação – se é que se pode chamar assim – de 0,1% do número de analfabetos com 15 anos ou mais no Brasil.


Uma variante mais do insignificante do ponto de vista estatístico. Porém isso não significa que o dado em si deve ser alvo de atenção. E, ao contrário do que a “grande imprensa” noticiou como sendo – ou dando a entender – “culpa” do governo federal a “exorbitante” variação desse índice, a educação básica é de responsabilidade, prioritariamente, dos municípios, com algumas escolas públicas estaduais com essa faixa de ensino.

Outro dado que chama a atenção é que diminuiu o percentual de pessoas com 25 anos ou mais sem instrução ou com menos de um ano de estudo. Passou de 15,1% para 11,9%. E o número de pessoas com nível superior completo no Brasil passou de 11,4% para 12%, um total de 14,2 milhões de pessoas.

Vivemos no país onde a “grande imprensa” usa a desinformação como instrumento de medo. Medo de que as coisas acabem, de que o que foi conquistado escoa pelo ralo. Nossa grande mídia alimenta o ódio de classe encruado em boa parte da chama classe média que, ao ver os trabalhadores passando a ter condições de frequentar lugares antes exclusivos dos ”sustentadores do país” – como faculdades, shoppings e aeroportos –, expõe todo seu ranço.

A PNAD possui diversos indicadores onde se permite estudar um pouco da realidade brasileira em 2012, mas para não perder o costume, a ênfase foi em um dado que variou 0,1%. Talvez esse seja o grau de confiabilidade dos autoproclamados “grandes” na imprensa brasileira.