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segunda-feira, 22 de julho de 2013

Metrópolis

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Assisti anteontem, pela primeira vez, o clássico do cinema mudo, Metrópolis, do cineasta alemão Fritz Lang.

Esse filme, feito em 1926, têm vários elementos do chamado expressionismo alemão, como a estética um tanto onírica, em especial no design dos cenários, exagero tanto nas maquiagens como nos gestos, uma critica a relação máquina x homem, relacionando ao conceito real x imaginário muito presente nesse movimento artístico.

Há de se ressaltar que a película de Lang sofreu muitos danos e diversas cenas se perderam, a versão que assisti não continha as partes encontradas em 2008 na Argentina, e muito menos todas as cenas do original, apresentado em 1927. Porém, mesmo assim, o filme é impressionante.



O enredo é baseada no romance de Thea Von Harbou, que também participou da roteirização cinematográfica, e conta a história de um local dividido em dois estratos, um dos operários, que vivem na cidade do subsolo, e trabalham tal qual máquinas alimentando máquinas, e a idílica cidade de cima, Metrópolis, onde os ricos desfrutam dos resultados do labor incansável e monótono dos operários pobres, totalmente alienados. Tudo começa a mudar quando a angelical Maria leva crianças pobres dos operários ao jardim dos ricos, para apresenta-las aos que lá se divertiam, e encanta Freder, o filho do criador e Mestre de Metrópolis, Joh Fredersen. O filme passa por vários momentos, inclusive com a criação da Máquina-Humana (um andróide, para os padrões de hoje), com a aparência de Maria, criada para semear o caos tanto na cidade de cima, como na cidade de baixo.

A estética do filme é fantástica e impressiona principalmente se pensarmos nas dificuldades técnicas do começo do século XX. Lang conseguiu criar com movimento e imagem uma sensação de desconforto em muitas cenas, como nas imagens dos operários, que em fila e passo lento retornam, de cabeça baixa,  para a cidade no subsolo. Ou no movimento aparentemente caótico e sem sentido dos operários movendo os ponteiros das máquinas. Em contrapartida, criou muito bem a sensação de liberdade, luxúria e beleza no jardim dos ricos.



O filme utiliza muitas alegorias bíblicas para ajudar a desenvolver a história, e a simbologia mística católica preenche muito bem a proposta de Lang, com as visões proféticas, leituras de trechos do apocalipse, fazendo um verdadeiro enlace entre o mundo divino e o homem que quer se divinizar.

A criação blasfêmica da Máquina-Humana, que aqui se confunde com a Grande Prostituta do Apocalipse é o fio condutor da crítica do filme em relação a soberba do homem. 



A atriz Briggite Helm interpretou Maria e seu double, a Máquina-Humana, de maneira magistral, teve o momento mais impressionante para mim no filme ao dançar (enquanto Máquina-Humana) de maneira mecânica / sensual para a platéia dos ricos moradores de Metrópolis, que com seus rostos carregados de luxúria e olhares lânguidos são hipnotizado e começam a brigar entre si, como uma turba de animais, desfazendo todo e qualquer verniz de civilidade. Ao mesmo tempo, Freder têm visões apocalíptica da Grande Prostituta, bem como citações bíblicas... Essa dança, assim como a atitude da Máquina-Humana, com movimentos bruscos e exagerados criaram, para mim, um dos momentos mais marcantes de toda a história do cinema. É sensual , grotesco e hipnotizante ao mesmo tempo.



Outro ponto marcante é a revolta dos operários. Enquanto a Máquina-Humana, como avatar dos pecados capitais,  incita a destruição da Metrópolis pela luxúria, nos operários ela incita a ira para destruir as máquinas. 

Essa mistura entre o sagrado e o profano cria simbolismos nos próprios personagens. Maria seria uma profeta, pura e angelical, cuja visão prevê a chegada de um mediador (o filho do criador e diretor de Metrópolis), que seria o coração a mediar entre o cérebro (os ricos de Metrópolis) e as mãos (os operários), enquanto a Máquina-Humana (que Rotwang, a pedido de Fredersen,  criou a imagem de Maria) representaria os pecados dos homens, que levam a aniquilação. Vê-se que a visão de Lang sobre o cérebro (Fredersen, dos ricos) e as mãos (Grot, dos operários) é um tanto reacionária, e mesmo a esperada "luta de classes" é condenada pois a revolta dos operários é retratada como um erro proporcional a luxúria dos ricos. Os operários são vistos como acéfalos raivosos, enquanto os ricos como aproveitadores alienados.



Apesar disso, Metrópolis é um dos melhores filmes de todos os tempos, com uma excelente narrativa, estética de tirar o fôlego e atuações inspiradas (principalmente se levarmos em conta que o filme é mudo). Seus personagens estão entre os mais poderosos do cinema, suas cenas são coreografias impecáveis, enfim, um filme dos anos 20 que além de ser atual em muitos aspectos, é uma aula sobre cinema e arte.